quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Educação financeira não é só coisa de gente grande

Fonte: http://brasil247.com.br/pt/247/seudinheiro/15717/Educa%C3%A7%C3%A3o-financeira-n%C3%A3o-%C3%A9-s%C3%B3-coisa-de-gente-grande.htm

Educação financeira não é só coisa de gente grande
Educação financeira não é só coisa de gente grandeFoto: Shutterstock

De forma lúdica e eficiente, crianças podem ser estimuladas, desde cedo, a se tornarem adultos com inteligência financeira. Prerrogativa de ensinar é dos pais

21 de Setembro de 2011 às 00:01
Luciane Macedo _247 -- "Você não sabe o valor do dinheiro", diziam os pais da geração baby-boomer, em tom de severa censura, diante das incessantes demandas dos filhos por mais e mais brinquedos, doces e diversões. E muitas dessas crianças, da chamada geração X, tornaram-se adultos tateando na penumbra quando o assunto é finanças. Poucos foram educados em casa sobre o valor do dinheiro e o custo de realizar desejos. O cenário econômico de quem cresceu nos anos 80, com inflação galopante, desvalorização diária da moeda, especulação e até escassez de bens, foi totalmente desfavorável às intenções dessa geração de se educar no trato com seu dinheiro. Esse aprendizado foi conquistado tardiamente, a passos lentos. E a disciplina financeira é, em grande medida, mais recente ainda, um exercício diário.
Mas as crianças e adolescentes de hoje, da geração Y, têm a chance de reverter esse quadro desfavorável que perdura há décadas no Brasil. Plugados na internet, eles querem tudo: do último gadget às grifes mais quentes do momento, dos brinquedos mais modernos à viagem dos sonhos para a Disney. Pode parecer, aos pais, que a lista de prioridades desses meninos e meninas é simplesmente sem fim. Mas ambos têm em mãos uma ferramenta poderosa para administrar todos esses desejos: educação financeira. E ela pode ser tão simples quanto enviar seus filhos para se divertir num acampamento durante as férias escolares ou aproveitar as oportunidades -- "Pai, compra, compra, compra! -- para ensinar, desde cedo, o valor do dinheiro.
Para além dos números e dos livros, o aprendizado vivencial e familiar fica para a vida toda. Pesquisas mostram que crianças que aprendem a lidar com seus desejos de consumo e a administrar seu dinheirinho desde cedo estão mais propensas a se tornarem adultos disciplinados com suas finanças pessoais e mais preparados para investir no futuro, fazendo escolhas inteligentes e trocas vantajosas.
Ensinar através do aprendizado vivencial, de forma leve e divertida, é a proposta de Silvia Alambert, licenciadora oficial e diretora-executiva do programa The Money Camp no Brasil. A criação americana, que já beneficia crianças e jovens em dez países, foi "totalmente tropicalizada" por Silvia para se adaptar ao contexto das crianças brasileiras. O Money Camp pode ser levado a qualquer sala de aula e também conta com um acampamento em Atibaia, onde gincanas e jogos ao ar livre estimulam as crianças a pensar financeiramente, mas sem a complicação de fórmulas ou teorias que elas não podem compreender. Aliás, não há ensino teórico e nem livros na metodologia do Money Camp. "Não dá para abrir uma fórmula de juros compostos para uma criança, mas ela aprende através de dinâmicas e brincadeiras", diz Silvia. "Há um único livro de atividades que a criança pode abrir, em casa, para recordar o que aprendeu, mas só se ela tiver vontade", acrescenta a diretora do Money Camp, assinalando que, geralmente, as próprias situações que se apresentam posteriormente, no dia-a-dia normal das crianças, acabam trazendo à tona as memórias e lições do aprendizado vivencial que tiveram.
Segundo Silvia, geralmente as crianças chegam meio desconfiadas ao acampamento quando se fala em educação financeira. "Elas acham que vão ficar trancafiadas", brinca a educadora. "Mas quebra-se o gelo já dentro do ônibus, quando as crianças recebem um dinheiro de mentirinha", conta Silvia. O dinheiro serve para as crianças se manterem no acampamento.
A metodologia inovadora do Money Camp, vivencial e lúdica, foi o que mais estimulou Silvia a licenciar o programa por aqui. Em meio a seus pares, sem os pais por perto e com muita diversão, as crianças brincam de ser investidores, empreendedores, aprendem o valor do dinheiro e até os juros compostos do cartão de crédito. "Elas chegam ao acampamento achando que o cartão de crédito é simplesmente um cartão mágico, porque a mãe entra na loja com o cartão e sai com um monte de compras", comenta Silvia, bem-humorada.
A interação com as crianças rende à educadora vários momentos engraçados e de satisfação pessoal ao ver que as crianças realmente voltam para casa diferentes. "Teve uma mãe que veio me contar que tomou bronca do filho porque estava usando o cartão de crédito sem ter pago a fatura integral", relembra Silvia. "É um aprendizado pela brincadeira e não pela dor, como foi com a geração anterior", salienta, referindo-se aos brasileiros endividados que só começaram a aprender como equilibrar suas finanças pessoais depois de ter ficado sem crédito, nas listas de mau pagadores.
"As pessoas acham que educação financeira é só falar de investimento e dinheiro", comenta Silvia. "Na verdade, é bem mais que isso, diz respeito à maneira como as pessoas se comportam com o dinheiro e isso envolve todos os hábitos e crenças adquiridos ao longo da vida", ressalta a educadora e membro da International Association for Citizenship, Social & Economics Education, com sede na Inlgaterra. Formada em secretariado bilíngue, Silvia se dedicava à área de treinamento e desenvolvimento empresarial e ao ensino de inglês antes de ir aos Estados Unidos para conhecer a criadora do Money Camp, Elisabeth Donati, e, assim, poder trazer o inovador programa ao Brasil.
Desde 2007, mais de 2.200 crianças já passaram pelo acampamento e cerca de mil vivenciaram o programa inovador em sala de aula. Duas escolas incorporaram a metologia lúdica do Money Camp ao seu currículo, entre elas o Colégio Castelo Branco, na capital paulista.
São números pouco representativos para um país das dimensões continentais do Brasil -- mais ainda considerando-se o fato de que, até recentemente, não se aprendia educação financeira nas escolas públicas e nem nas particulares, com raras exceções. Segundo Silvia, vários fatores alimentam essa realidade, entre eles o atraso da própria escola brasileira e também um certo preconceito com a idéia de ensinar nossas crianças a terem inteligência financeira desde cedo. "Por incrível que pareça, algumas pessoas temem que os filhos se tornem pessoas ganaciosas", comenta a diretora-executiva do Money Camp, assinalando que este tipo de temor não poderia ser mais injustificado, já que vivemos na era da informação. "A geração do século 21 quer coisas consistentes com a vida deles, porque eles têm toda a informação disponível, enquanto que a escola está no século 19", critica a educadora.
Neste sentido, o projeto-piloto de educação financeira do Ministério da Educação, em andamento em mais de 900 escolas, já é um passo adiante. Mas a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF) é direcionada, pelo menos por enquanto, apenas ao ensino médio. A iniciativa de incluir as crianças, continua sendo, portanto, uma prerrogativa dos pais.
Mas como educá-los? "Educação financeira se faz o tempo todo", indica Silvia. "Nossos filhos são ótimos vendedores, nos convencem a comprar tudo", brinca a educadora. "São nesses momentos que os pais devem aproveitar a oportunidade e iniciar uma outra conversa, que desperte o interesse da criança", orienta. Algumas boas estratégias são fazê-la pensar em algo melhor ou oferecer escolhas atraentes. Veja mais dicas da diretora-executiva do Money Camp, especialmente para "Seu Dinheiro", no texto abaixo. "Os melhores modelos estão dentro de casa", diz Silvia. "Seria muito importante que os pais conversassem com os filhos sobre dinheiro, poupar e investir, porque a escola, sozinha, não consegue", assinala a educadora. "O ideal seria que houvesse um trabalho conjunto entre pais, educadores e crianças", conclui.
Para saber mais sobre o Money Camp e as temporadas de férias no acampamento, visite o site em wwww.themoneycamp.com.br.
Arquivo pessoal

O mundo do dinheiro na vida prática dos pequenos
A educadora Silvia Alambert orienta como os pais podem aproveitar inquietações comuns dos filhos para ensinar conceitos simples de educação financeira
O que diz a criança: "Quero ser sócia do dono daquela padaria. Você ouviu ele dizer quantos pãezinhos ele vende por dia"?
Conceitos: trabalho, remuneração, empreendedorismo, investimento, inteligência financeira
Como você pode orientar seus filhos: É importante que as crianças aprendam desde cedo que, para se ter dinheiro na vida, é preciso trabalhar. Ainda que você seja dono do seu próprio negócio e tenha
funcionários trabalhando por você, você cuida para que seu negócio prospere. Mostre que há formas de colocar o dinheiro para "trabalhar" junto com você para que, no futuro, você possa trabalhar apenas porque gosta, e não mais porque precisa. É importante mostrar às crianças que pessoas com inteligência financeira colocam seu dinheiro para "trabalhar" por elas. Quando você troca o seu tempo e energia por dinheiro, você está trabalhando, tendo que ralar para manter um estilo de vida que você escolheu para você e sua família. Ao colocar todos os meses parte do seu dinheiro para "trabalhar" por você em algum tipo de investimento, seu dinheiro começa a "trabalhar", dando “filhotes”. Os “filhotes” vão crescendo, ficando maiores e dando outros “filhotes”. Até o momento que haverá tantos “filhotes” do dinheiro que você investiu trabalhando por você, que você não mais precisará trabalhar duro e poderá curtir a vida como sempre sonhou. Multiplicar dinheiro é colocar o dinheiro para "ralar por você", enquanto você pode curtir as coisas que escolher fazer. Não é uma boa idéia ensinar as recompensas do trabalho aliado à inteligência financeira?
O que diz a criança: "Tem dias que meu pai diz que podemos sair, porque ele tem dinheiro. Mas, em outros, ele fala que não podemos, porque ele não tem mais dinheiro. De onde veio o dinheiro e por que ele acabou"?
Conceitos: dinheiro, de onde vem, como é usado em casa, despesas e lazer, orçamento familiar
Como você pode orientar seus filhos: Deixar a criança no vazio é um dos grandes erros que os pais cometem de forma inconsciente, pois elas não entendem porque um dia tem dinheiro e no outro dia não tem. É preciso explicar a elas de onde vem esse tal dinheiro que parece aparecer e desaparecer como um coelho numa cartola mágica. É preciso que elas entendam que dinheiro é fruto de trabalho e trabalhar significa você trocar seu tempo e energia por dinheiro que irá proporcionar a elas a moradia, a alimentação, as roupas, os brinquedos, as viagens, e que há uma quantia a ser gasta com algumas coisas durante o mês. Deixar a criança achando que simplesmente "não tem dinheiro" é deixá-la pensando que estão falidos. Então, é importante mostrar a elas de onde vem o dinheiro e como ele é distribuído no orçamento familiar ao longo do mês.
O que diz a criança: "Mãe, nós somos ricos"?
Conceitos: riqueza, ser e ter, dar valor ao que se tem, gratidão
Como você pode orientar seus filhos: É muito comum crianças olharem para outras crianças e julgarem que são ricas só porque têm algum brinquedinho tecnológico mais moderno, como um celular ou game. A criança fica imaginando que as outras são ricas, mas ela não é. Quando faz essa pergunta aos pais, a criança só quer a confirmação de um pensamento que já tem formado. Pergunte a ela o que ela acha e por que ela acha aquilo. Você se surpreenderá com a forma como ela vê não somente a questão da riqueza material, mas como ela vê o comportamento da família com relação ao dinheiro. Explique que a questão da riqueza inclui outros itens que não só coisas materiais (saúde, felicidade, harmonia familiar, tranquilidade financeira, etc). Oriente para o fato de que ter algo de última geração não significa, necessariamente, ser rico e que você não sabe qual foi o esforço da família daquela criança para que ela pudesse ter aquilo. A verdadeira riqueza não consiste em você ter coisas, mas em ser quem você é, sem precisar provar ou mostrar nada a ninguém. Eduque seu filho para que ele seja feliz e saiba valorizar e ser grato por tudo o que ele tem.
O que diz a criança: "Compra, pai! Compra, compra, compra"!
Conceitos: gastar dinheiro, desejos, necessidades, escolhas inteligentes
Como você pode orientar seus filhos: Gastar com inteligência nada mais é do que realizar escolhas inteligentes com o seu dinheiro e não se deixar levar pela emoção do momento. Seu filho necessita ou só deseja? Crianças sempre querem o que as outras crianças têm, é natural. E se você perguntar a uma criança se aquilo é um desejo ou uma necessidade, é bem provável que ouça que tudo o que ela quer é uma necessidade. Cabe, portanto, aos pais, mostrar aos filhos que é possível termos as coisas que desejamos, mas é necessário um preparo antes de sair gastando. Use um exemplo familiar à criança para explicar a questão do preparo. Se ela deseja muito se sair bem em alguma prova, deverá se preparar. Talvez ela tenha que abrir mão de alguns dos seus dias para poder estudar, ao invés de só brincar. Vai ter que fazer uma escolha entre ir bem na prova para poder brincar com tranquilidade depois. Mostre que, com o dinheiro, não é diferente. Se a criança deseja muito comprar uma coisa, explique que os pais terão de se preparar para aquela compra, ou seja, talvez tenham que abrir mão de algo para poder ter o que parece mais necessário. Explique que é preciso se preparar e fazer escolhas com o dinheiro, para não ficar com zero no "boletim da vida". A vida é feita de escolhas e escolhas inteligentes é que nos levam a resultados positivos.
O que diz a criança: "Quando disseram que iríamos brincar com crianças em uma creche na periferia, fiquei com medo. Mas, depois de encontrá-las e brincar com elas, descobri que são crianças como nós, são só mais simples".
Conceitos: abundância, doação, diferenças, solidariedade
Como você pode orientar seus filhos: O imaginário das crianças é como uma caixinha mágica. Quando damos a elas a oportunidade de externar tudo o que cabe lá dentro, suas crenças, pensamentos e sentimentos, também somos tocados pela magia. A doação também faz parte da educação financeira, já que sua prática permite criar pensamentos de abundância de tudo para todos. Se eu estou doando meu tempo, meu sorriso, meus brinquedos, minhas roupas a quem necessita, significa que eu tenho mais do que suficiente para mim e posso fazer felizes aqueles que precisam mais do que eu. Crie a oportunidade e veja a magia da solidariedade acontecer.

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